jan 31 2023
Desenquadramento das EPPs e MEs e obrigatoriedade de autodeclaração nos certames licitatórios

Gustavo Pedron da Silveira
É obrigatória a promoção do desenquadramento da condição de beneficiária da Lei Complementar nº 123/2006 se extrapolado o limite de faturamento
A Lei Complementar nº 123/2006 institui o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte. Destaca-se o contido no caput do artigo 3º e nos respectivos inciso II, § 3º, § 9º e § 9º-A. Veja-se:
Art. 3º Para os efeitos desta Lei Complementar, consideram-se microempresas ou empresas de pequeno porte, a sociedade empresária, a sociedade simples, a empresa individual de responsabilidade limitada e o empresário a que se refere o art. 966 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), devidamente registrados no Registro de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, conforme o caso, desde que:
II – no caso de empresa de pequeno porte, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta superior a R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais) e igual ou inferior a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais).§ 3º O enquadramento do empresário ou da sociedade simples ou empresária como microempresa ou empresa de pequeno porte bem como o seu desenquadramento não implicarão alteração, denúncia ou qualquer restrição em relação a contratos por elas anteriormente firmados.
(…)
§ 9º A empresa de pequeno porte que, no ano-calendário, exceder o limite de receita bruta anual previsto no inciso II do deste artigo fica excluída, no mês subsequente à ocorrência do excesso, do tratamento jurídico diferenciado previsto nesta Lei Complementar, incluído o regime de que trata o art.122, para todos os efeitos legais, ressalvado o disposto nos§§ 9o-AA,100 e122.§ 9o-
A. Os efeitos da exclusão prevista no§ 9oo dar-se-ão no ano-calendário subsequente se o excesso verificado em relação à receita bruta não for superior a 20% do li (vinte por cento) mite referido no inciso II do caput.
Do § 3º alhures transcrito é possível extrair que não há impacto nos contratos administrativos já firmados pelo consulente.
Já pelo previsto no § 9º e 9º-A, a obrigação de declarar o desenquadramento se dá no mês seguinte ao excesso do limite de faturamento, sendo que, se não for superior a 20%, pode ocorrer no ano-calendário subsequente.
No âmbito do Estado do Paraná, a matéria é regulamentada pela Lei Complementar nº 163/2013 e pelo Decreto Estadual nº 2.474/2015, contendo, basicamente, a seguinte previsão:
Art. 12. O licitante é responsável por solicitar seu desenquadramento da condição de microempresa ou empresa de pequeno porte, microempreendedor individual quando houver ultrapassado o limite de faturamento estabelecido no art. 3.º da Lei Complementar Federal n.º 123, de 2006, no ano fiscal anterior, ou por outra razão perder a condição de beneficiário do tratamento diferenciado, sob pena de ser declarado inidôneo para licitar e contratar com a Administração Pública, sem prejuízo das demais sanções caso usufrua ou tente usufruir indevidamente dos benefícios previstos neste Decreto.
Desta maneira, interpretando as normativas nacionais com as estaduais tem-se que não há impacto nos contratos administrativos já firmados, entretanto, pode haver responsabilização e sanção, no âmbito de processos licitatórios, caso não promova o seu desenquadramento.
A Procuradoria Geral do Estado do Paraná – PGE/PR se manifestou acerca do tema por meio do Parecer nº 28/2017 – PGE, se posicionando no sentido de que:
“Assim, o enquadramento e o desenquadramento da empresa é um ato declaratório da própria empresa, independente de procedimentos burocráticos complexos.
Ao tempo que é um ato de diminuta formalidade, vemos que é obrigação da empresa fazer a declaração quando não reunir os requisitos de microempresa e empresa de pequeno porte. Participar de licitação utilizando os benefícios sem os condicionantes constitui-se em fraude, tipificada no art. 90 da Lei nº 8.666, de 1993, o que pode levar o licitante a ser declarado inidôneo, de acordo com o art. 156 da Lei Estadual nº 15.608, de 2007.”
O Tribunal de Contas da União já decidiu sobre a matéria, estando a mesma pacificada no âmbito das Cortes de Contas, cita-se o Acórdão nº 970/2011 – Plenário, Relatoria do Ministro Augusto Sherman, paradigma:
“Enunciado
Constitui fraude à licitação a participação de empresa na condição de microempresa ou empresa de pequeno porte, sem apresentar essa qualificação, em razão de faturamento superior ao limite legal estabelecido, situação que enseja a declaração de inidoneidade da pessoa jurídica envolvida. A perda da condição de microempresa ou empresa de pequeno porte, por ser ato declaratório, é de responsabilidade da sociedade empresarial.
(…)
12. Ressalte-se que a informação da perda da condição de ME ou EPP, por ser ato declaratório, era de responsabilidade da empresa que, por não tê-la prestado e por ter auferido indevidamente os benefícios da LC 123/2006, ação que caracteriza fraude à licitação, deve ser declarada inidônea para participar de licitações na administração pública federal.”[1]
Ainda, no âmbito do Tribunal de Contas da União, no Acórdão nº 745/2014 – Plenário, Relatoria Ministro Marcos Bemquerer Costa, decidiu-se que o momento do desenquadramento deve ser pautado pelo excesso ou não dos 20% de faturamento, vejamos:
“21. Independentemente da periodicidade da escrituração contábil, a empresa pretendente a usufruir do regime favorecido de participação nas licitações de que trata a Lei Complementar n. 123/2006 tem o ônus de manter o controle constante do seu faturamento e atualizar com fidedignidade seus dados constantes em sistemas informatizados da administração pública.
22. Dizer que a escrituração do balanço, de periodicidade anual, seria o marco para a constatação do excesso de receita e da perda da condição de empresa de pequeno porte significaria tornar letra morta o § 9º do art. 3º da Lei Complementar n. 123/2006, que impõe o desenquadramento da empresa no mês seguinte àquele em que houver excesso de faturamento, e também ao § 9ºA, que condiciona a prorrogação da perda da condição de ME ou EPP para o ano-calendário posterior apenas na hipótese de o excesso de receita bruta situar-se na faixa de 20%.”
O Tribunal de Contas do Estado do Paraná, em consonância com o Tribunal de Contas da União, estabeleceu voto no mesmo sentido. O Acórdão nº 3784/2017 – Plenário, Relatoria Conselheiro Fernando Augusto Mello Guimarães, é claro ao pontuar o momento do desenquadramento:
“De acordo com a LC 123/06, uma vez excedido o limite de receita caracterizador da empresa como de pequeno porte, cessa o direito ao tratamento diferenciado. Caso o excesso seja inferior a 20%, o novo regime é aplicado no anocalendário subsequente; caso o excesso seja superior a 20%, o novo regime é aplicado no mês subsequente (…)
Nesta esteira, não se mostra cabível a alegação de que a verificação dependeria o fechamento do balanço patrimonial. Conforme se extrai do texto legal, uma vez que a receita supere 20% do limite, devem ser adotadas todas as medidas para que os benefícios cessem no mês seguinte.
(…)
Ademais, o “enquadramento, reenquadramento e desenquadramento de microempresa e empresa de pequeno porte pelas Juntas Comerciais será efetuado, conforme o caso, mediante arquivamento de declaração procedida pelo empresário ou sociedade em instrumento específico para essa finalidade” (art. 1º da Instrução Normativa 103/2007, do Departamento Nacional do Registro do Comércio).”
Na mesma toada, o Decreto Federal nº 8.538/2015 explicita o funcionamento do enquadramento das microempresas e empresas de pequeno porte para fins dos benefícios da Lei Complementar nº 123/2006 nos certames públicos.
Art. 13. Para fins do disposto neste Decreto, o enquadramento como: (…)
§ 1º O licitante é responsável por solicitar seu desenquadramento da condição de microempresa ou empresa de pequeno porte quando houver ultrapassado o limite de faturamento estabelecido no art. 3º da Lei Complementar nº 123, de 2006 , no ano fiscal anterior, sob pena de ser declarado inidôneo para licitar e contratar com a administração pública, sem prejuízo das demais sanções, caso usufrua ou tente usufruir indevidamente dos benefícios previstos neste Decreto.
§ 2º Deverá ser exigida do licitante a ser beneficiado a declaração, sob as penas da lei, de que cumpre os requisitos legais para a qualificação como microempresa ou empresa de pequeno porte, microempreendedor individual, produtor rural pessoa física, agricultor familiar ou sociedade cooperativa de consumo, estando apto a usufruir do tratamento favorecido estabelecido nos art. 42 ao art. 49 da Lei Complementar nº 123, de 2006 .
A solicitação de desenquadramento mencionada no § 1º do artigo 13, acima transcrito é regulamentada, no âmbito administrativo, pela Instrução Normativa nº 10/2013 do Departamento de Registro Empresarial e Integração – DREI, especificamente em seu Anexo II, onde é explicitado a operacionalização da solicitação.
O procedimento da instrução normativa estabelece que o desenquadramento de microempresa e empresa de pequeno porte será realizado mediante solicitação perante a Junta Comercial, devendo ser composto por um requerimento dirigido ao Presente da Junta Comercial do Estado do Paraná, requerendo o arquivamento da declaração de desenquadramento.
A declaração de desenquadramento, por sua vez, deverá ser estruturada do seguinte modo:
· Nome empresarial, endereço, número de identificação do registro de empresa – NIRE, data de registro do ato constitutivo e número de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica – CNPJ; e,
· A declaração, sob as penas da lei, todos os sócios de que a sociedade se desenquadra da condição de microempresa ou empresa de pequeno porte, nos termos da Lei Complementar nº 123/2006;
Ainda, para efetivação regular do desenquadramento da condição de microempresa ou empresa de pequeno porte, o interessado deverá proceder a inclusão do objeto da sociedade empresária no nome empresarial, mediante arquivamento da correspondente alteração contratual na Junta Comercial.
1. DA CONCLUSÃO
Deste modo, podemos aduzir que a alteração na condição de beneficiária da Lei Complementar nº 126/2003 não impacta nenhum contrato administrativo já firmando, havendo importância apenas para as próximas licitações pretendidas.
Também, consigna-se que é obrigatória a promoção do desenquadramento do da condição de beneficiária da Lei Complementar nº 123/2006 se extrapolado o limite de faturamento. O desenquadramento deverá ser promovido no mês seguinte quando exceder mais de 20% do limite ou no ano calendário seguinte caso não exceda 20% do limite de faturamento.
Para efetivar o desenquadramento, deve-se encaminhar declaração de desenquadramento para o Presidente da Junta Comercial do Estado do Paraná e solicitar o seu processamento e arquivamento. Também, deverá promover a alteração do nome empresarial para fazer constar expressamente o objeto da sociedade, devendo, igualmente, promover o respectivo arquivamento na Junta Comercial.
[1] Na mesma linha: Acórdão n.g. 1028/2010-Plenário TCU, TC-005.928/2010-9, rel. Min. Walton Alencar Rodrigues, 12.05.2010; Acórdão n2 3.381/2010-Plenário TCU, Relator Walton Alencar Rodrigues, D.O.U. de 16/12/20100.
Elaborado com contribuição do bacharelando Jordano Lyon Della Pasqua da Silva
Fonte: https://gustavopedron.jusbrasil.com.br/artigos/765731524/desenquadramento-das-epps-e-mes-e-obrigatoriedade-de-autodeclaracao-nos-certames-licitatorios